Deu tudo certo. Saiu exatamente como o planejado. Quase nada fora do script. Talvez um número de votos menor que o esperado, talvez votos em excesso para um rebelde, mas, no fim das contas, as eleições que definiram os presidentes da Câmara e do Senado ontem foram de acordo com o que o governo desejava. Aliás, não só o governo, e talvez seja esse o grande problema.
Na verdade, o que aconteceu ontem não é mais do que um retrato de como vem sendo tratada a relação entre os poderes da república desde a redemocratização do país, em 1985. É claro que, num cenário político/econômico de grande instabilidade, como foram os períodos de José Sarney e Fernando Collor na presidência, existe mais espaço para a "rebeldia" dos parlamentares insatisfeitos e a oposição tem mais bala na agulha para se afirmar como oposição. Mas, quando o país encontra o rumo da estabilidade, como ocorreu a partir da segunda metade do governo de Itamar Franco, ser contra se torna, por assim dizer, criticar o que está dando certo. E obviamente ninguém quer o desgaste de fazer papel de chato diante da opinião pública. Talvez por isso, os governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula experimentaram pouca oposição, ou ainda, uma oposição desqualificada, desprovida de argumentos e cuja fala soava no vazio.
No governo FHC, ainda tínhamos um PT que, mesmo de maneira atabalhoada, assumia o papel de criticar o governo. Mas o PT ainda não havia experimentado as maravilhas do poder nesse período, de maneira que era mais fácil afirmar que, se estivesse no lugar dos tucanos, faria diferente. O PT chegou ao poder e, de duas uma: ou achou que os tucanos estavam certos e por isso não mexeu na essência da política de FHC, ou, mesmo discordando, não tinha de fato uma proposta de país melhor do que a dos antecessores.
Para o PSDB, a situação ficou ainda pior depois da eleição de Lula. Como fazer oposição se os adversários mantinham aquilo que havia sido implantado no governo tucano? Isso tornou o discurso peessedebista sem credibilidade. Muito possivelmente, isso explica o fracasso tucano nas duas últimas campanhas presidenciais.
Toda essa história é para ilustrar o quadro que vivemos hoje na política brasileira. Certa vez, em entrevista a um jornal de Belo Horizonte, o então prefeito da capital mineira e hoje ministro do desenvolvimento, indústria e comércio, Fernando Pimentel, chegou a dizer que, quem quer que assumisse o governo, a estabilidade conquistada a duras penas não seria posta em xeque. O que ele quis dizer, e com razão, é que não há mais espaço para soluções milagrosas no Brasil. Quando o país está caminhando de maneira tranquila, sem sobressaltos e com estabilidade política e econômica, fecham-se as portas para agendas messiânicas. Isso é bom? Sim, por uma parte. É sinal de que o país está prosperando e isso é reconhecido pelas principais correntes políticas. Por outro lado, a oposição perde boa parte do combustível que dá vida ao seu discurso e acaba sedendo a muitas das vontades do governo.
É isso que aconteceu ontem no Congresso. A eleição de Sarney e Marco Maia para presidir o Senado e a Câmara foi fruto de um grande acordo entre os partidos da base aliada e da oposição. O pior é que esse acordo não leva em conta apenas a estabilidade dos trabalhos no parlamento, mas tem uma contrapartida do governo, que é a generosa distribuição de cargos entre os partidos que o apóiam. Que a política brasileira é fisiologista e que os cargos são a razão do apoio de muitos partidos, não é novidade para ninguém. O mais grave é que, se a oposição aceita participar do acordo em nome da chamada construção do consenso, é sinal de que ela também compactua com os métodos do governo. E agora José? Que base tem para criticar o governo uma oposição que compactua com as manobras pouco éticas desse mesmo governo?
O fato é que o Congresso Nacional foi palco ontem da demonstração de que, atendidos os interesses de cada grupo político, governo e oposição podem caminhar de mãos dadas, numa espécie de pacto de não agressão, como aquele assinato por Hitler e Stalin antes da II Guerra Mundial. No fim das contas, governo e oposição fizeram um mexidão de camaradas, o que provou que as instituições políticas do país vão mal. Ao fim e ao cabo, PT e PSDB nada mais são do que as duas faces de uma moeda podre: o parlamento brasileiro.
quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011
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