terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Eles têm medo do quê?

Estava decidido a não escrever sobre a vinda da blogueira cubana Yoani Sánchez ao Brasil. Não por achar que ela não mereça. Ao contrário, penso que toda pessoa que usa a sua capacidade intelectual para se insurgir contra um regime ditatorial (e para mim não interessa se uma ditadura é de direita ou de esquerda, porque todas são ditaduras), merece ser elogiada e portanto merece um artigo em um blog, mesmo simples e desconhecido como é o Mexidão.

O que me tinha inclinado a não escrever, no entanto, era o fato de que a notícia da passagem de Yoani Sánchez pelo Brasil seria tão divulgada e comentada, que ficaria difícil acrescentar algo novo ao que já estava sendo dito.

Contudo, quando eu estava decidido a não escrever, pensava que a vinda de Yoani ao Brasil traria polêmica, levantaria acaloradas discussões sobre o regime cubano, provocaria embates memoráveis entre políticos ligados aos partidos de esquerda, ou que assim se definem, e os centristas ou direitistas. Pensei que os ânimos se exaltariam, que palavras de ordem fossem ditas, que até alguns insultos típicos da política seriam ditos no plenário da Câmara dos Deputados ou na imprensa. Tudo isso seria tolerável dentro do processo democrático e, mesmo que tudo isso ocorresse, eu não viria a este blog comentar a visita de Yoani ao Brasil.

Mas o que me fez mudar de ideia e comentar o caso foi a transformação da liberdade de manifestação em tentativa de intimidação, da democracia em baixaria e desrespeito. Por mais absurdo e paradoxal que possa parecer alguém se manifestar democraticamente em favor de uma ditadura, vale lembrar que esse é um direito constitucional. Defender governos, sejam eles democráticos, ditatoriais, monárquicos, teocráticos, é legítimo e também legal. Portanto as manifestações contra Yoani e a favor dos irmãos Castro, as palavras de ordem taxando-a como traidora, embora ela nunca tivesse mudado de lado e sempre tenha sido abertamente contrária ao regime, nada mais são do que o exercício de uma garantia dada pela nossa ordem jurídica e pela nossa democracia.

No entanto, essas manifestações só são legítimas quando existe a possibilidade do contraditório. Quando impediram a realização de eventos como palestras e noites de autógrafos com Yoani Sánchez, os tais militantes pró Fidel mostraram exatamente porque tanto apreciam o regime político instalado em Cuba desde 1959, aliás, uma espécie de dinastia Castro. Eles rezam pela mesma cartilha dos irmãos Fidel e Raul: impor suas ideias através da intimidação dos que pensam de modo diverso. Na ótica dessas pessoas, se eu não confio nas minhas ideias o bastante para convencer os demais de que estou certo, o melhor é silenciar as ideias contrárias às minhas. Em Cuba, isso muitas vezes significou eliminar os próprios autores dessas ideias que se opunham ao regime. No Brasil, as manifestações, que a princípio seriam apenas fruto da nossa jovem democracia, foram levadas ao extremo de impedir Yoani Sánchez de falar em vários eventos para os quais foi convidada.

Pergunto então: do que essa militância tem medo? Não seria mais democrático ouvir o que Yoani tem a dizer e depois, com os melhores argumentos, derrubar uma a uma de suas “mentiras” sobre o “paraíso” que é a vida da população cubana? Seria mais democrático de fato, mas seria mais perigoso. Afinal, se os argumentos para contrapor as ideias da blogueira não fossem bons o suficiente, a população brasileira poderia ser convencida de que Yoani está dizendo a verdade e que suas convicções são oriundas de uma vida de restrições, especialmente na falta de liberdade para se expressar. A democracia é muito perigosa para os que não querem ou não sabem debater suas ideias, por isso é sempre mais efetivo silenciar os oponentes, seja por que estratégia for.

Volto a dizer: sou contra todas as ditaduras. Mas parece que não é essa a posição de muitos dos militantes ditos de esquerda no Brasil. Na verdade, muitos dos que lutaram contra a tirania dos militares no poder entre 1964 e 1985, não lutaram contra a instituição da ditadura. Eles lutaram contra aquela ditadura específica. No entanto, quando a ditadura é comandada pela sua corrente ideológica, eles não se colocam contra. O apego dessas pessoas à democracia é tão frágil quanto uma tira de pano tentando segurar um avião. Eles estão sempre em busca de quem lhes diga “amém”. E quando aparece alguém como Yoani Sánchez e se recusa a participar da brincadeira com essas regras, esses militantes fazem birra e param de brincar. E ainda chamam de traidora aquela que discorda deles. Felizmente para ela e para nós, Yoani não está sozinha. E aos militantes que tentaram impedi-la de falar, sugiro que mandem esculpir uma estátua em homenagem à democracia e se ajoelhem diante dela. Afinal, não fosse essa que eles tanto insistem em chamar de democracia burguesa, eles não poderiam ter sequer se manifestado e muito menos da forma desrespeitosa como o fizeram. A boa nova é que essas pessoas não representam o pensamento do povo brasileiro. Um brinde a isso!

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